FRADE E A FREIRA, O
Espírito Santo
A montanha do Frade e da Freira fica situada entre os municípios de Cachoeiro de Itapemirim e Rio Novo do Sul, e sempre pertenceu ao primeiro. Porém, quando o segundo se tornou independente, sua administração bateu pé e quis ficar com a rocha em seu território, provocando uma discussão que o IBGE, como mediador natural da questão, já anunciou que vai solucionar através da medição das terras, mas ninguém sabe quando. Sobre o problema, a opinião popular tida e havida como consensual é a de que Cachoeiro tem os melhores ângulos para contemplar o monumento natural que tanto embeleza aquela região.
Ao escrever sobre sua terra natal (cujo nome significa água encachoeirada, leito acidentado pelo excesso de pedras, formando torrentes espumosas) o cachoeirense Evandro Moreira esclarece que “seus primeiros desbravadores foram os frades jesuítas, que pesquisavam ouro nas Minas do Castelo, desde 1625, tendo ali construído uma capela e a Aldeia dos Montes. O caminho não era ainda o rio Itapemirim. Demandava-se as Minas a partir do rio Doce ou, provindo de Minas Gerais, pela região do rio Manhuaçu, por onde chegou Pedro Bueno Cacunda, em 1705 e que é considerado o primeiro bandeirante dos "cachoeiros". Também se chegava diretamente de Benevente e Itapemirim pelo antigo caminho de Santa Cruz, por onde fugiram os garimpeiros das Minas, por volta de 1776, fixando-se na região do baixo Itapemirim (Vila e Barra)”. E continua: “A partir de 1812, existiu aqui o Quartel da Barca, que era um referencial para os soldados que batiam as matas, formando um triângulo ‘passando pela estrada do Rubim (ligando Vitória a Mariana), seguindo pelo sertão até a fazenda da Muribeca (dos frades Jesuítas que pesquisavam ouro, situada no extremo da Província)...”.
Por essa explanação se fica sabendo que há quase quatrocentos anos os frades andavam pela região sulina do Espírito Santo em busca de almas e ouro, o que fortalece a veracidade da lenda que muitos e muitos anos depois, em 1938, adquiriu foro de verdade nos versos de Benjamim Silva (1886-1954), natural de Castelo, então ainda pertencendo a Cachoeiro de Itapemirim, que figura em várias antologias de poetas nacionais com o soneto “O Frade e a Freira”, um dos mais conhecidos da poesia espírito-santense: Diz ele:
Na atitude piedosa de quem reza,
e como que num hábito embuçado,
pôs, naquele recanto, a natureza
a figura de um frade recurvado.
E sob um negro manto de tristeza
vê-se uma freira, tímida ao seu lado,
que vive ali rezando, com certeza,
uma oração de amor e de pecado.
Diz a lenda – uma lenda que espalharam –
que aqui, dentre os antigos habitantes,
houve um frade e uma freira que se amaram.
Mas que Deus os perdoou lá do infinito,
E eternizou o amor dos dois amantes
Nessas duas montanhas de granito.
Mas como na vida tudo tem um porem, o escritor José Augusto Carvalho, mineiro de Governador Valadares, mestre em Lingüística pela UNICAMP, e doutor em Língua Portuguesa pela USP, revela em artigo de sua autoria que dois autores espírito-santenses haviam se insurgido contra essa lenda. Em 1968, diz ele, foi a vez de Maria Stella de Novaes, que em seu livro “Lendas Capixabas”, alega que as freiras só chegaram ao Espírito Santo no início do século 20, enfatizando, ainda, que “uma lenda não pode incidir num anacronismo, nem discrepar a história”. Anos depois (2004), foi a vez de Rodrigo Campaneli publicar “As Mais Belas Lendas Capixabas”, no qual, com esse mesmo argumento ele reconta a história centenária mudando-lhe o título para “O Frade e a Índia”, ou seja, por obra e arte dele, desaparece a freira cheia de amores, dando lugar a uma indiazinha não menos romântica.
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